sexta-feira, agosto 21, 2009

Onde estamos: Complexo do Alemão, Rj, Brasil



Foto: Sadraque Santos


Nossa Comunidade chama se Complexo do Alemão, complexo composto por treze favelas (comunidades) distintas, são elas Morro Alemão, Grota, Nova Brasília, Alvorada, Alto Florestal, Itararé, Morro Baiana, Morro Mineiro, Morro da Esperança, Joaquim de Queiroz, Cruzeiro, Morro das Palmeiras e Morro do Adeus .O Complexo se encontra na Serra da Misericórdia, parte central da região da Leopoldina, abrangendo uma área compreendida por cinco bairros, Inhaúma, Bonsucesso, Ramos, Olaria e Penha.


O bairro existe há aproximadamente sessenta anos, mas os dados que levantamos afirmaram que, logo após a Primeira Guerra Mundial, um polonês chamado Leonard Kaczmarkiewicz deixou a Polônia fugindo da guerra e adquiriu lotes de terra da Serra da Misericórdia (hoje, Morro do Alemão). Supõe-se que a ocupação se iniciou em 1951, quando Leonard começou a dividir todo o terreno para vendê-los em lotes. Por suas características físicas e por seu sotaque carregado, Leonard ficou conhecido como Alemão, dando origem ao nome atual do Complexo.






Recuando mais um pouco na história, descobrimos que depois da colonização dos portugueses, os primeiros habitantes da nossa região foram os índios Tamoios que viviam aqui em meio à mata atlântica virgem, às margens do farto Rio Timbó (Timbó porque era o nome do cipó que eles utilizavam para envenenar a água e pescar os peixes). Visualizando o quadro dessa época, podemos concluir que duas coisas básicas não lhes faltavam, uma boa água fresca e uma mesa muito farta de comida e de especiarias da sua cultura, coisa que com o passar dos tempos, se tornaram raras para a população que hoje ocupa essa mesma região. Já no século XVI, os portugueses haviam exterminado todas as tribos, utilizando apenas suas “faluas” para navegarem pelos rios.

Logo começaram a chamar a região de “Tapera de Inhaúma” por causa das “tabas” (antiga moradia dos índios) abandonadas. A palavra “Inhaúma” se origina de um pássaro extinto da região chamado “Inhaúm”. Em 1943, a região onde hoje se encontra o Complexo do Alemão, fazia parte da grande freguesia rural e, depois, suburbana de Inhaúma. A área da antiga freguesia no século XVIII estendia-se do atual bairro de Cascadura até a Penha, indo até o atual bairro do Caju e a Serra do Andaraí, abrangendo os atuais bairros de Olaria, Bonsucesso, Ramos, Engenho da Rainha, Inhaúma e Manguinhos (bairros do entorno do Complexo do Alemão). Nesses limites, incluíam-se doze ilhas, situadas no mar de Inhaúma> O mar também chegava aos sopés da Serra da Misericórdia (Complexo do Alemão), nas proximidades do atual bairro de Olaria. É importante lembrar que o Complexo de favelas do Alemão, como já foi sugerido anteriormente, está situado na Serra da Misericórdia que, no passado, era uma extensa área verde, mas que, com o passar do tempo, foi sendo dizimada em decorrência da construção de casas e da presença de uma pedreira que, predatoriamente, vem destruindo ainda hoje o pouco que resta de área verde. Na época do governo Vargas, as ilhas mencionadas acima, foram unidas através de aterros formando a ilha do Fundão, onde se encontra hoje a Universidade Federal do Rio de Janeiro, fazendo com que as praias de Olaria e Penha também fossem recuadas. Também existia uma extensa área de mangue incluindo o território dos bairros de Ramos, Bonsucesso e Manguinhos.
A antiga “freguesia de Inhaúma” teve grande importância histórica por ser a freguesia rural, mais tarde, urbana, mais próxima ao centro da cidade. No início de sua ocupação, nos séculos XVI e XVII, Portugal enviou estrategicamente para essa região jesuítas, militares e funcionários do governo, principalmente para próximo da costa marítima, com o objetivo de melhor proteger o território da invasão estrangeira. Desde os primeiros habitantes, um dos principais meio de transporte da região era os rios, sendo usadas pequenas embarcações que escoavam toda a produção agrícola para os portos, de onde era exportada ou encaminhada para o centro da cidade.

A região era dividida em vários engenhos. No ano de 1666, no engenho de “Nossa Senhora de Nazareth”, situava-se a Olaria dos Barreiros que produzia tijolos e escoava a sua produção através do porto de “Maria Angu” nas proximidades do atual bairro da “Penha”, onde se localiza uma famosa igreja carioca, a Igreja de Nossa Senhora da Penha.
A área onde hoje se encontra o Complexo do Alemão pertenceu, no passado, ao Engenho da Pedra e à Fazenda das Palmeiras. Ainda existe a casa grande da Fazenda das Palmeiras que funciona, atualmente, como asilo de idosos. Mas, infelizmente, durante a construção da Linha Amarela, já nos tempos atuais, o então prefeito César Maia construiu um condomínio residencial com mais de trezentas moradias populares do tipo quitinete nos arredores dessa casa, desvalorizando totalmente o patrimônio cultural e histórico do nosso bairro.

A primeira paróquia da região foi a matriz de “Santiago de Inhaúma” construída no século XVII. Hoje essa igreja se situa na atual praça de Inhaúma, onde se encontra o primeiro colégio da região, a Escola Municipal “Barão de Macúba”, fundada em 1910.

Durante todo o século XIX, a população da região triplicou. Em 1820, as condições de exportação do açúcar refinado e do café (principais agro-culturas do engenho) eram boas, representando respectivamente 23,1% e 18,7% do total das exportações do Rio de Janeiro, o que estimulava a produção das grandes propriedades inhaumenses. Entre 1821 e 1871, essas condições se alteraram consideravelmente, estimulando novas formas de utilização da terra. O açúcar participava, então, com apenas 12, 3 % do total das exportações quase triplicou a sua participação, chegando, em 1873, a 50,2% do total das exportações do Estado. Isso refletiu no início do processo de retaliação das terras pertencentes aos engenhos, pois, devido ao fato das grandes lavouras de café esgotarem rapidamente a terra, se tornava necessário um constante deslocamento de suas plantações, deixando para trás terras esgotadas. A freguesia de Inhaúma foi pioneira na implantação de grandes lavouras cafeeiras que, na segunda metade do século XIX, já se encontravam em processo de decadência.

O território da região teve importante papel, também, na época da exploração do ouro nas Minas Gerais, quando o Rio de Janeiro era o principal escoadouro da produção mineira. Na freguesia de Inhaúma se tinha uma das vias de transporte mais rápida até os portos, onde se utilizavam pequenas embarcações pelos rios “Faria, Jacaré e Timbó”, esse último passando aos sopés do Complexo do Alemão. Além disso, havia duas estradas (São Paulo, atual Dom Hélder Câmara, e Estrada Velha da Pavuna, atual Ademar Bebiano) que faziam a comunicação das Minas Gerais com o centro da cidade, assim como, com a capitania de São Paulo.

A freguesia rural dava lugar à área suburbana residencial proletária mais importante do Distrito Federal do Rio de Janeiro nas duas primeiras décadas do século XX. Em 1903 a Freguesia de Inhaúma virou o 19º distrito do Rio de Janeiro.

Os principais meios de transporte dos trabalhadores até o centro da cidade eram as embarcações que faziam paradas nos portos de “Maria Angu” e “Caju”. Em 23 de outubro de 1886, foram inauguradas as quatro estações férreas da região, Carlos Chagas, Bonsucesso, Olaria e Ramos, construídas pela companhia inglesa da Leopoldina Railway. Mesmo assim, as companhias de embarcações continuaram a fazer linhas no porto de “Maria Angu” nas épocas de festas de Nossa Senhora da Penha.

A partir da década de 1920, o que se tinha na região eram inúmeras propriedades de pequeno porte com uma grande variedade de produções e com muitas pessoas a procura de novas propriedades.

Fazendo um salto aos tempos de hoje, segundo informações conseguidas através da XXIX R. A (Complexo do Alemão), a região abrange 437.880 m² e o ponto culminante está a 138 m de altura, tendo em seu topo uma área florestal que abrange 30% da região.

Quanto à infra-estrutura, temos fornecimento de luz elétrica em todo o assentamento, mas, devido a algumas instalações precárias, a luz se torna fraca e, ás vezes, falta. No verão, o mesmo acontece com a água encanada que chega na maioria das casas, mas ainda há moradores que se abastecem de poços artesianos e algumas nascentes de água que somam doze no total. No que diz respeito à rede de esgotos, se constata uma certa precariedade em alguns pontos onde se encontram valas negras a céu aberto com a população despejando o esgoto direto nos corpos hídricos, que, em alguns casos, passam em frente a algumas moradias. Por isso, algumas crianças que brincam ao redor dessas valas, assim como o restante dos moradores, correm risco de serem contaminados com algum tipo de doença. Outro fator que contribui para que isso aconteça são os lixões que, apesar de serem poucos, ainda existem na região. Esses lixões não se tornam maiores graças ao serviço de “garis comunitários”, implementado pela prefeitura através da Comlurb, empresa responsável pela coleta de lixo.

Em algumas fontes pesquisadas por nós, não foi encontrado nenhum posto de saúde dentro da comunidade, no entanto, existem nas proximidades alguns postos que atendem com precariedade a população do Complexo do Alemão. São eles o PAM (Posto de Atendimento Médico) de Ramos, o PAM de Del Castilho, o posto de saúde da praia de Ramos e o PAM do Engenho da Rainha. Muitas vezes, não é possível o atendimento nesses postos e, com isso, as pessoas são encaminhadas para locais mais distantes. Uma coisa muito comum e que, às vezes é retratada nos jornais da cidade, é a chegada, ainda na madrugada, dos moradores nos postos de saúde pra conseguir, depois de uma longa espera, um atendimento que, geralmente, é de péssima qualidade.

Em relação ao transporte público, existem oito empresas de ônibus que cobrem a região e que só funcionam até às 0h. Depois, quem deseja se dirigir a outros pontos da cidade só tem como opção as kombis de lotação que, antes, nesses horários, cobravam tarifas acima do preço normal, fato que mudou depois da diminuição dos fregueses. Cabe lembrar que esses meios de transporte estão, na maioria das vezes, em situação irregular, mas, apesar disso, são de extrema importância para a população local, pois, além de atenderem suas necessidades de locomoção, que não são plenamente supridas pelas empresas de ônibus, fazem parte também do sistema de economia informal, oferecendo vagas de emprego para um certo número de pessoas da comunidade, que, se não fossem essas possibilidades, estariam desempregadas, como acontece com grande parte de outros moradores. Temos também os serviços de “moto táxi” que levam os usuários a qualquer parte da favela. Os moradores que não utilizam esses serviços, são obrigados a andar longas distâncias até suas casas, às vezes, tendo que subir ladeiras muito íngrimes.

O sistema ferroviário, com quatro estações (Olaria, Ramos, Bonsucesso e Penha) que ligam a comunidade à Central do Brasil, também é bastante utilizado. Existe também o transporte metroviário que liga a Baixada ao Centro e abrange parte do bairro de Inhaúma, sendo utilizado por uma pequena parte dos moradores do Complexo. É importante informar que tanto o sistema ferroviário, quanto o metroviário, estão fora dos limites da favela.

Com relação ao comércio, a região conta com pelo menos três grandes redes de supermercados, todos fora das favelas do Complexo, além de contar com um variado número de estabelecimentos dentro da favela, como açougues, farmácias, biroscas, pequenas lojas de roupas, armarinhos, pequenas papelarias, pequenos mercados e algumas feiras livres.

O Complexo do Alemão tem sido contemplado, ultimamente, com alguns projetos sociais de cunho educacional que vem facilitando e melhorando a qualidade de vida de algumas pessoas. Temos, por exemplo, os projetos Vida Nova, Telessala (1º e 2º grau), pré-vestibular comunitário, entre outros. Mas como a comunidade possui uma extensão territorial muito grande e cerca de 250 mil moradores, esses projetos não atingem a todos, beneficiando uma porcentagem pequena das pessoas que necessitam desses benefícios.

Existem, pelo que encontramos, três escolas dentro do Complexo do Alemão, a Escola Municipal Mourão Filho, o Ciep Theóphilo de Souza Pinto e a escola Municipal Henrique Foresis, que atende até a quarta série. As demais escolas que atendem ao Complexo se situam fora de seus limites e são a Escola Municipal Walt Disney, Escola Municipal Padre Manuel da Nóbrega, Escola Municipal João Barbalho, que à noite se transforma em Escola Estadual Taciel Cileno, Colégio Cardeal Leme (particular) que à noite se transforma em Escola Estadual Zélia Gonzáles, Escola Municipal Chile, Colégio Pinheiro (particular), Instituto Relvas (particular) e Escola Estadual Carneiro Ribeiro. Apesar desse número de escolas, não é raro encontrar criança sem matrícula, mesmo porque, devido ao grande número de moradores, essas escolas não suprem toda a demanda do Complexo.

Existe também um sistema de creches bastante utilizado pelas famílias da comunidade. São creches educativas e, a maioria delas, são financiadas pela prefeitura. No Morro da Baiana existe a Creche Eliane Saturnino Braga; no Morro do Adeus, a Creche São Pedro Nolasco e a Escola Comunitária Pedro Vileli; no Morro do Alemão, a Creche pré-escolar João Ferreira; no Morro do Itararé, a Creche Escola e a Creche Cemasi José Vieira da Silva; em Nova Brasília, o Jardim Escola Novo Mundo, o Centro Educacional Estrela da Manhã, o Ciep Theóphilo de Souza Pinto, a Creche Cemasi Nova Vida e a Creche Mundo Feliz. Em todas as creches, as crianças aprendem, se alimentam na hora certa e brincam, mas as vagas também não são suficientes para atender toda a população, por isso não é raro encontrar crianças perambulando à toa pelas vielas das favelas e em situação de abandono.

As rondas policiais são feitas pelas polícias Militar e Civil, como também pelo BOP (Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar). Em alguns casos, a atuação da polícia, às vezes, é violenta. São comuns tiroteios entre policiais e traficantes, resultando, muitas vezes, em ferimentos por balas, seguidos de morte, em pessoas inocentes. É comum os moradores tomarem “dura”, principalmente os jovens. Essas duras visam a apreensão de pequenas quantidades de drogas encontradas com usuários, mas, algumas vezes, resultam em extorsão, por parte dos policiais, de dinheiro que esses usuários são obrigados a pagar para não serem presos ou agredidos. Em certos casos, qualquer tipo de infração, por menor que ela possa ser, torna-se motivo de agressão por parte dos policiais.

As grandes festas populares que acontecem aqui são os bailes funk, realizados freqüentemente nas praças e quadras da comunidade, uma das pouquíssimas formas de lazer da população da favela. Se não fossem os bailes e os pagodes, não existiria quase nada voltado para o lazer dos moradores. Eles são organizados pelas associações de moradores em parceria com equipes de som. Também existem alguns forrós, que acontecem na sexta e no sábado, freqüentados, na maior parte das vezes, pelos moradores de origem nordestina residente e por poucos jovens. Os pagodes também acontecem de vez em quando nos mesmos locais dos bailes funk, mas só enchem mesmo quando aparece uma atração conhecida. Quando são grupos anônimos a freqüência não é tão intensa.

Os centros culturais dos bairros estão todos fora dos limites das favelas. São pouco freqüentados pelos moradores dos morros e favelas pelo fato de não atenderem às expectativas da grande massa dos jovens que preferem outros tipos de lazer. No entanto, os shows musicais têm sido, ultimamente, a grande atração para aqueles que procuram algo diferente dos bailes funk.
Alguns dos grandes nomes da MPB já se apresentam na comunidade, tais como Caetano Veloso, as bandas O Rappa, Cidade Negra, Gabriel, o Pensador, entre outros, lembrando que esses shows não acontecem com freqüência. A Escola de Samba Imperatriz Leopoldinense também se situa a poucos metros do Morro do Alemão, mas, como cobra ingresso, só é mais freqüentada pelas pessoas da comunidade quando há entrada franca ou próximo ao carnaval.

Existem cinco campos de futebol espalhados pelas comunidades onde acontecem campeonatos anuais e algumas “peladas organizadas”. Os campeonatos são organizados pelos times da comunidade mesmo, que fazem tudo: comunicam-se entre eles, organizam os horários etc.

Apesar de ter uma grande extensão territorial, o Complexo do Alemão não dispõe de nenhum cinema ou teatro. Os mais próximos se encontram nos shoppings nas redondezas, não atendendo a grande maioria da população favelada devido ao valor dos ingressos que estão além das possibilidades dos moradores. As bibliotecas existentes atendem a uma minoria dos moradores, pois se localizam na R. A. (Região Administrativa) e no SESC de Ramos, fora dos morros e favelas. Em relação aos Fóruns Judiciais, não existe nenhum nas proximidades do Complexo.

Existem aproximadamente trinta e oito igrejas, evangélicas e católicas, e também centros espíritas não contabilizados, sendo grande a freqüência dos moradores. Muitas vezes, as instituições religiosas ajudam as pessoas mais necessitadas com mantimentos, roupas, calçados e, também, com o “cheque cidadão” implementado pelo governo do Estado, a fim de melhorar a alimentação dos moradores das favelas. O “cheque cidadão” funciona através de um cadastramento de famílias de baixa renda que é feito nas igrejas que fazem reuniões periódicas com as pessoas cadastradas e distribuem os cheques vindos de Brasília.

Grande parte dos moradores das favelas trabalham nos comércios que se localizam na própria comunidade e, uma outra grande parte, trabalha fora da comunidade. Muitos têm o propósito de conseguir seu emprego trabalhando por conta própria. Existem também diversas pessoas idosas que se mantêm com a aposentadoria e outras que são mantidas com pensões familiares. Alguns moradores se profissionalizaram em trabalhos sociais e existem que são advogados, médicos, professores, garis, etc, muitos prestando serviços na própria comunidade.

Existe uma banda carioca que tem uma música chamada “021” que, num trecho, diz o seguinte: “é muito fácil falar de coisas belas, de frente para o mar e de costas pra favela”, daí se pode tirar uma comparação entre qualquer favela e o resto da cidade. Aqui não estamos acostumados a presenciar turistas, sejam eles de outro estado ou até mesmo de outro país. Ninguém está interessado em levar para sua casa um cartão postal com uma foto da favela, até porque não existe. Mesmo porque não há muita beleza ou conforto nas favelas, principalmente se comparada com a Zona Sul carioca.

Nenhum comentário: